segunda-feira, julho 03, 2006

A democracia da informação na América Latina ainda é um sonho

Por Brenno Sarques

Durante a XXXVI Assembléia-Geral da OEA, em São Domingos, na República Dominicana, os ministros anunciaram na sua declaração final a determinação de garantir "o direito de todos à liberdade de expressão através de todos os meios de comunicação de massa, inclusive a internet".

O lema da Assembléia, que terminou dia 5 de junho de 2006, foi "Governabilidade e desenvolvimento na sociedade do conhecimento". Nas sessões plenárias, os ministros deixaram claro o interesse em trabalhar para reduzir o desnível tecnológico na região.

Todos ratificaram a intenção de facilitar o "acesso universal às tecnologias da informação e comunicação". Outro compromisso foi o de melhorar e ampliar as iniciativas para reduzir as desigualdades e a pobreza, usando as novas técnicas como "ferramentas de desenvolvimento".

O chanceler da República Dominicana e presidente da reunião, Carlos Morales Troncoso, ressaltou na sessão de encerramento o "compromisso continental" de alcançar a meta através de um caminho que todos os países "podem e devem percorrer juntos".

Presença brasileira

O Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Embaixador Celso Amorim, discursou durante a reunião da OEA. Para o chanceler brasileiro, as negociações com seus parceiros dominicanos traduziram a confiança mútua entre os países.

Inspirado pelas palavras do Ministro chileno, Amorim enfatizou a importância dos aspectos sociais das desigualdades da região latino-americana. “Eu me lembro de ter lido, quinze anos atrás, um artigo de um compatriota chileno da Cepal, em que comparava vários modelos de crescimento econômico, como o da Coréia: muita inversão em ciência e tecnologia”. O Ministro brasileiro chamou a atenção para que havia três tipos de países, num quadrilátero na América Latina. Aqueles que haviam tido rápido crescimento, e baixa eqüidade (ex. Brasil), aqueles que tinham tido razoável eqüidade, mas baixo crescimento (ex. Uruguai); e outros, como era o caso da maioria, que haviam tido baixo crescimento e baixa eqüidade. Mas na matriz, havia um quadrado vazio, que era o quadrado do crescimento com eqüidade.

A partir disso, Celso acredita que, talvez, quando se olha para outros continentes e procura-se saber quais as razões porque estamos atrasados em alguns aspectos, talvez a principal razão tenha sido que a América Latina nunca foi capaz de vencer esse desafio do crescimento com eqüidade. “Tivemos momentos de crescimento sem eqüidade, tivemos períodos de eqüidade sem crescimento. O nosso grande desafio é o crescimento com eqüidade. E é isso que vai tornar possível, também, o desenvolvimento científico e tecnológico, a compreensão maior de que é preciso poupar para investir naquelas coisas que podem trazer benefícios no futuro”, ressaltou. O chanceler brasileiro insistiu que esse é o grande desafio na região. Por isso, elogiou especialmente o colega chileno e afirmou procurar seguir os seus passos.

Conforme o chanceler chileno Alejandro Foxley, a justiça social não se realizará só no plano nacional, mas também no plano internacional. Amorim concorda e acredita que a referência ao G-20 é mais do que apropriada, pois o que o grupo dos 20 países em desenvolvimento procura, dentro das negociações comerciais que se realizam em Doha, é juntar a liberalização comercial, que é importante, com a justiça social. A força que o G-20 possui, sobretudo com outros grupos, também de países em desenvolvimento, foi juntar esses dois aspectos importantes e que normalmente estiveram dissociados nas negociações internacionais: a liberalização e a justiça.

“Obviamente o tema desta Conferência é a brecha digital. E a brecha digital não é senão um aspecto dessa brecha social enorme. As pessoas não têm acesso a computadores, não têm acesso à internet, porque não têm renda. E, por isso, a brecha aumenta”, escancarou o chanceler brasileiro. Para ele, o trabalho deve aproveitar aquilo que já pode ser reunido. Trocar experiências entre os países sul-americanos para fazer com que a inclusão digital passe também a ser fator de inclusão social é o caminho a ser seguido. A inclusão social é importante não só porque dá acesso ao conhecimento; ela permite ao cidadão fiscalizar diretamente o que fazem os governos, dá maior transparência às ações governamentais e permite a sociedade saber com precisão como se dão os resultados das eleições.

Nesse processo, o Brasil está profundamente empenhado internamente, mas também se esforça em difundir o conhecimento produzido em seu território, seja bilateralmente, seja com o concurso da OEA. A cooperação internacional pode ajudar países como, por exemplo, o Haiti, onde vários países latino-americanos estão profundamente envolvidos em fazer com que o Haiti tenha uma real possibilidade de se libertar dos problemas do seu passado e enfrentar o futuro.

Celso Amorim reitera que aspecto da governabilidade, é essencial. “Estamos prontos a ajudar o Haiti. Como manifestamos ao chanceler da Bolívia, David Choquehuanca, estamos prontos a ajudar a Bolívia também e outros países nas questões de governabilidade, que são talvez as questões centrais, sem as quais não conseguiremos avançar o suficiente”, oferece.

Eleições

Durante o discurso do representante brasileiro no encontro em São Domingos, o Peru foi elogiado pelas eleições que se realizaram em clima de total liberdade, assim como parabenizou todos os países que também tiveram eleições recentemente, sobretudo eleições gerais, como é o caso da Colômbia, aprofundando mudanças sociais que o Presidente Uribe começou, e, em outros casos, com mudanças de natureza mais profunda, diga-se Bolívia.

A Organização dos Estados Americanos é considerada por Celso Amorim “sui generis”, porque possui grande heterogeneidade. A OEA tem dois países super-desenvolvidos, alguns em desenvolvimento médio e outros pouco desenvolvidos. Mesmo assim, tem conseguido, ao longo de quase um século de existência, manter uma unidade. A manutenção desta unidade não tem sido fácil. “Ver o cisco no olho vizinho é mais fácil do que ver a trave no seu próprio olho”, resume Amorim. A próxima reunião anual da Assembléia será no Panamá.

Fontes: Ministério das Relações Exteriores do Brasil e Organização dos Estados Americanos (OEA).