sábado, junho 24, 2006

África: novo alvo da China

Brenno Sarques

Em visita à África, o primeiro ministro chinês Wen Jiabao, propôs um novo modelo de parceria baseada na igualdade comercial, assim como o fez o seu presidente Hu Jintao, há dois meses, no mesmo continente. Jiabao tem compromissos em sete países africanos (Congo, Angola, Tanzânia, África do Sul, Egito, Gana e Uganda).

Na África do Sul, o primeiro ministro reafirmou as intenções de uma parceria proveitosa para ambos os países. Conforme análise do comunista, os novos parceiros africanos recebem as propostas chinesas sem demonstrar nenhuma contraposição política. "Nós não queremos exportar nossos valores e nosso modelo de desenvolvimento", explicou o primeiro ministro, em seu encontro na Cidade do Cabo. Como prova do ambiente de negociações amigáveis, Jiabao prometeu restringir a quantidade de têxteis exportados da China para a potência africana.

Assim como em quase todo o planeta, o continente africano tem sido atacado por uma onda de produtos "Made in China", que beneficiam o país asiático. Para se ter uma idéia, a China já é o terceiro maior parceiro comercial da África, atrás apenas dos Estados Unidos e França. O comércio bilateral entre a o continente negro e Pequim cresceu 400% nos últimos seis anos, chegando a marca de US$ 10 bilhões.

Outros Interesses

Os chineses não buscam apenas a ampliação de mais um mercado para seus produtos mercadologicamente endêmicos. Eles buscam, antes de tudo, novas fontes de fornecimento mineral e de petróleo. Com o crescimento do consumo e da demanda por matérias-primas, este é o maior desafio para as autoridades e para o empresariado chinês. O país mais populoso do mundo deixou de ser auto-suficiente em petróleo em 1993. Depois disso, passou a depender, em 25% de suas necessidades, dos recursos minerais provenientes do Sudão, Nigéria e Angola.

Visto que se tornaram os principais consumidores de cobre, a China tornou-se uma das maiores investidoras na extração desse mineral na Zâmbia e na República Democrática do Congo. Recentemente, Pequim anunciou o financiamento da construção de termelétricas no Zimbábue, em troca de cromo.

Com a África do Sul, a conversa é diferente. Lá, eles não têm petróleo para vender, mas possuem boas idéias que podem ser rentáveis. Durante o embargo internacional sobre Pretória, durante o regime do Apartheid, a Sociedade Nacional de Hidrocarburantes (Sasol) desenvolveu uma tecnologia de produção de combustível a partir do carbono. Durante a visita do primeiro ministro chinês, a Sasol assinou um contrato de continuidade de seus estudos e de viabilidade de instalar duas usinas na China. O mercado é de US$ 10 bilhões. A SAB-Miller, grande fabricante de cerveja, está presente no gigante asiático e é uma das responsáveis em fazer da África do Sul um parceiro mais ativo do que passivo em relação à China, isto é, que realiza mais investimentos externos do que recebe de seu parceiro mandarim. A própria maneira como o Partido Comunista trata seus assuntos com Pretória - diferentemente da forma como são tratados com outros países africanos - mostra que a África do Sul está bem a frente de seus vizinhos, em termo de economia.

Com o restante do continente, a China realiza seus ‘affairs’ como bem entende. Os países ocidentais, os quais a China busca mercado, não hesitam em uma aproximação maior com os comunistas. A bandeira vermelha pouco se importa com os direitos humanos, com a democracia ou com uma boa governabilidade. Desta forma, enquanto o Banco Mundial (Bird) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) tentam pressionar os países produtores de petróleo a melhor gerenciarem suas fontes, para conceder novos empréstimos, a China não pede nada em troca.

Como forma de apressar o andamento dos negócios, a China tenta demonstrar uma certa responsabilidade internacional. Wen Jiabao anunciou a doação de 795 mil euros à missão de paz da União Africana em Darfur, capital do Sudão. Outros dois milhões de euros vão ajudar os refugiados na região oeste deste país, considerado pela revista Foreign Policy, o pior lugar do mundo. O Sudão é um dos principais parceiros comerciais da China na África. Mesmo assim, o primeiro ministro chinês não colocou em sua agenda, visitas a Darfur e ao Zimbábue, outro grande parceiro de negócios. No problem! Enquanto Jiabao visitava a África, a vice-presidente do Zimbábue, Joyce Mujuru, estava em Pequim.

Pelo que tudo indica, a África é realmente o novo alvo da China. O continente mais pobre do mundo tem escassez de produção industrial, mão-de-obra qualificada e instituições sociais concretizadas e estáveis. Em contrapartida, a África tem enormes quantidades de recursos minerais e petróleo.

O que a China quer fazer, é tomar o lugar ocupado, primeiramente, pelos colonizadores europeus e depois pelos Estados Unidos, ao fim da Segunda Guerra Mundial e da Conferência de Bretton Woods, onde foi acordado a independência de vários países africanos e a remarcação territorial de outros, para a entrada dos norte-americanos sem os ‘pactos coloniais’ que seguravam a África nas mãos dos europeus. A China não vai desenvolver a África, mas sim, explorá-la tão quanto seus antecessores, senão pior.

Fonte - LeMonde