segunda-feira, maio 15, 2006

Os piores lugares do mundo

Brenno Sarques
A revista Foreign Policy (Política Estrangeira), divulgou este mês a lista dos países falidos ou em risco de falência institucional. Conforme consta no estudo, 2005 deveria ter sido um período positivo para a maioria dos Estados, incluindo aqueles com pouca ou quase nenhuma experiência democrática, a exemplo do Egito, Iraque, Afeganistão e Cazaquistão, que passaram por eleições.
A boa notícia é que o número de conflitos armados de grandes proporções tem caído no mundo inteiro. Os países ricos vêm perdoando dívidas dos chamados “países em desenvolvimento”, que juntos somam bilhões de dólares. O comércio internacional vem se fortalecendo a ponto da China se tornar uma potência exportadora e a estabilidade econômica mundial tem se mantido sem grandes quedas. Entretanto, os conflitos de ordem étnica, de política nacional e de desigualdade social têm aumentado substancialmente nos últimos dois anos.
O documento mostra que as eleições, mesmo que comprovadas internacionalmente não refletem necessariamente em governabilidade. Da mesma forma, o aumento do preço do petróleo não significa desenvolvimento de instituições estáveis. A estabilização de um Estado depende da criação de um judiciário independente, serviços públicos competentes e de campanhas anti-corrupção. Instituições internacionais como as Nações Unidas (ONU), Banco Mundial (Bird) e Fundo Monetário Internacional (FMI) têm realizado um importante papel no desenvolvimento de países altamente carentes. As forças de paz da ONU em países como Moçambique, Timor Leste, Libéria e Namíbia têm conseguido manter uma certa estabilidade e mesmo conferir eleições diretas. Por outro lado, a manutenção das ações militares norte-americanas no Iraque e no Afeganistão aumenta as previsões de que intervenções armadas não promovem estabilidade.
Prever quando e como o próximo episódio de falência de um país acontecerá é algo improvável. Mas os observadores devem se ater à estatísticas que mostram as vulnerabilidades e fraquezas que criam condições para a falência de um país. No estudo apresentado, cada país está disposto dentro de um quadro que varia entre a Segurança e Estabilidade à Fraqueza e Vulnerabilidade. Países como a Nigéria e o Iran estão vulneráveis a conflitos internos e desintegração social, enquanto a China e mesmo a Rússia estão sob risco de ruptura institucional.
Este é o segundo Índice de Estados Falidos, produzido conjuntamente pelo Fundo para a Paz – organização independente de pesquisa – e a revista Foreign Policy. Foram usados 12 indicadores, nas áreas social, econômica, política e militar, onde 148 paises foram classificados conforme sua vulnerabilidade a violentos conflitos internos e ruptura social. A lista com os 60 países mais vulneráveis está disponível nos sites http://www.foreignpolicy.com/ e http://www.fundforpeace.org/.
As contagens do índice são baseadas em dados de mais de 11.000 fontes publicamente disponíveis, coletadas de julho a dezembro 2005. O período usado para o recolhimento dos dados significa que alguns eventos, entre eles, o início de uma guerra sectária no Iraque, em fevereiro, não são incluídos. Outros eventos, como o forte terremoto de outubro que atingiu o Paquistão, ocorreram no meio da janela da análise e tiveram um impacto significativo nos resultados. Inevitavelmente, o índice de países em risco de falência é um instantâneo prolongado melhor que uma análise continuada, por isso, as comparações com resultados do ano passado foram feitas sempre que possível; os resultados futuros renderão algumas tendências mais a longo prazo como os trilhos em que estes países seguem ano após ano.
A categoria de “estados falidos" abrange várias definições. Para as finalidades deste índice, um estado de falência é aquele em que seu governo não tem o controle eficaz de seu território, não é percebido como legitimo por uma parcela significativa de sua população, não fornece a segurança doméstica ou serviços públicos básicos a seus cidadãos, e falta um monopólio no uso de força. Um estado de falência pode experimentar a violência ativa ou simplesmente ser vulnerável à violência. A maioria dos estados listados no índice não está atualmente falido. O índice que mede a vulnerabilidade ao conflito interno violento é um índice do país em risco, não dos países que já faliram.
No ano passado, diversos acontecimentos demonstraram o que pôde ser denominado "bolsões da falência" dentro de estados fortes e estáveis. Nos Estados Unidos, o furacão Katrina expôs furos no índice de preparo para disastres do país. Os observadores em torno do mundo ficaram atônitos nos meses de agosto e setembro, em ver como a superpotência mundial deixou que milhares de seus cidadãos ficassem encalhados por dias. Dois meses mais tarde, violentos conflitos na França mostraram o abismo entre imigrantes muçulmanos e a sociedade francesa. Parcialmente em conseqüência destes eventos, a França e os Estados Unidos decaíram em seus índices de Segurança e Estabilidade, ficando atrás de outros paises como Finlândia, Suécia e Noruega, que emergiram como os mais estáveis.
Os sintomas da falência do Estado podem aparecer em todo o país em qualquer região do mundo, mas há diversas regiões com concentrações de estados fracos. Como no índice do ano passado, a África produz o número o maior de estados instáveis. Este ano, o Sudão aparece como o país mais vulnerável do mundo por causa de seus pobres índices nas áreas de expulsão da população e de direitos humanos. Sudão é seguido de perto pela República Democrática do Congo e da Costa do Marfim, cujos governos ainda não controlam parcelas enormes de seu território. Seis dos 10 estados mais vulneráveis e 11 dos 20 deles estão na África. Contudo o ranking demonstra também como generalizações regionais são inadequadas, mesmo para países próximos entre si. Zimbábue, esforçando-se sob o pobre governo e a disseminada corrupção, viu seu ranking da estabilidade cair 12 por cento, visto que a vizinha África do Sul manteve seu patamar. Nigéria, apesar de sua riqueza nos recursos, continuou no mesmo nível, enquanto Gana, país próximo remanesceu como um dos estados os mais promissores em toda a África ocidental. Quênia conseguiu melhorar seu ranking, apesar dos escândalos de corrupção e de uma fronteira conflituosa com a Somália. No sudeste asiático, Burma caiu, enquanto a vizinha Tailândia, mesmo com o confisco em suas próprias províncias do sul, aparece como um dos estados mais estáveis na região. O estudo mostra claramente que a liderança importa mais do que a localização. A maior surpresa foi a Venezuela, que subiu 12 pontos no estudo de 2005 em relação ao mesmo estudo do ano anterior, contrariando os resultados da maioria de seus vizinhos.
No estudo, há pontos realmente interessantes que refletem o estado de desenvolvimento de cada país. Enquanto a média de idade de uma população, nos países mais desenvolvidos é acima de 30 anos, no países com maior risco de colapso a média fica nos 18 anos. Índices de expectativa de vida, renda per capta, entre outros já conhecidos, ainda servem de parâmatro para análises de desenvolvimento econômico e social. Todavia a complexidade das relações institucionais e diplomáticas torna necessário um estudo mais aprofundado dos movimentos geopolíticos da atualidade, assim como foi realizado pela Fund For Peace e a Foreign Policy.